Hoje, talvez mais do que quando compôs, Drummond expressa a realidade brasileira:
ACORDAR, VIVER
Carlos Drummond de Andrade
Como acordar sem sofrimento?
Recomeçar sem horror?
O sono transportou-me àquele
reino onde não existe vida
e eu quedo inerte sem paixão.
Como repetir, dia seguinte após dia
seguinte, a fábula inconclusa, suportar
a semelhança das coisas ásperas de
amanhã com as coisas ásperas de hoje?
Como proteger-me das feridas que rasga
em mim o acontecimento, qualquer
acontecimento que lembra a Terra e sua
púrpura demente?
E mais aquela ferida que me inflijo
a cada hora, algoz do inocente que não sou?
Ninguém responde, a vida é pétrea.
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